Nós aqui, no jardim à beira-mar plantado, habituados aos brandos costumes, temos o conforto duma comunidade muçulmana (maior do que se pensa), pacata, confortável com o liberalismo ideológico da República e desejosa de prosseguir com a sua vida civil sem chatear ninguém e sem ninguém a chatear. Têm liberdade de culto (como aliás toda a gente, IURD, budistas, satânicos e fetichistas), podem exibir a sua crença à vontade (véus, máscaras, plumas, o que quiserem) e, embora provavelmente achem a nossa sociedade profana, dissoluta e despudorada, limitam-se a ignorar o que não lhes agrada. Que Alá os abençoe e os cubra de benesses.
Por isso nós aqui, no jardim, não temos muito a noção do que vai por essa Europa. Mas basta ter acesso à comunicação social francesa ou inglesa para ver a demência crescente que progressivamente toma mais espaço nesses países. Por um lado há as minorias muçulmanas radicais, cada vez mais descaradas na agressividade contra a cultura que as acolhe e aceita, e por outro lá há as autoridades cada vez mais baralhadas e hesitantes quando ao modo de lidar com esse radicalismo.
Em Inglaterra (muçulmanos: 5%), já se fala que a próxima coroação será “ecuménica”, os ministros descem à rua e são ameaçados e insultados, e as autoridades vão às comunidades minoritárias de chapéu na mão e jurar que não são facciosas. Outro dia, um polícia muçulmano recusou-se a fazer guarda em frente à embaixada de Israel e o comando concordou. John Reid, o ministro do Interior, ouviu um fanático perguntar-lhe “como se atreve a vir aqui, depois de ter prendido tantos de nós?” As histórias são diárias e absolutamente surrealistas.
Em França, passa-se o contrário: o Estado parece apostado em tomar todas as medidas possíveis para aumentar o número de radicais. É o caso da lei que proibiu o uso de lenço na cabeça às jovens muçulmanas das escolas. (A escola ser laica significa que a escola não ensina religião; não significa que as pessoas religiosas não podem ir à escola.) E o caso da lei que considera crime “negar o genocídio dos Arménios pelos Turcos”. (Estas leis que criminalizam negar certos massacres históricos parecem-nos tão absurdas como os massacres em si. Mas adiante.) Ao nível executivo, simultaneamente fecha-se os olhos à poligamia dos muçulmanos e dá-se dinheiro às “obras sociais” das mesquitas. Entretanto, todos os meses há centenas de carros incendiados, dezenas de polícias agredidos, milhares de áreas onde os não residentes não se atrevem a por os pés.
À conta de tudo isto, as cidades são vigiadas dia e noite (isto tanto em Inglaterra como em França) por incontáveis câmeras de segurança que vigiam os cidadãos continuamente.
Também à conta de tudo isto, cresce a xenofobia e o racismo. Num artigo do Guardian diz-se que essas atitudes estão “a chegar ao centro”, isto é, já não são exclusivas da extrema direita. A solução de deportar os descontentes parece cada vez mais a única solução para conseguir paz social. Simon Heffer, um dos mais cotados colunistas ingleses, diz que “quem queira viver segundo a sharia, há muitos sítios para onde pode ir. E que vá, o mais depressa possível. Se ficar, então que se comporte.”
A nós, o que nos deixa mais perplexos, é que nos sentimos inclinados a concordar com ele.