Sendo a inveja um dos nossos sentimentos prevalecentes, não surpreende que de vez em quando os escritores mais mediáticos sejam acusados de plágio por anónimos e desconhecidos. O ultimo caso aconteceu com Miguel Sousa Tavares, e propósito dele lembrámo-nos de outros.
Eduardo Prado Coelho foi acusado de ter plagiado um texto do conhecido autor brasileiro João Ubaldo Ribeiro. Sendo Prado Coelho quem é – uma luminária da crítica-comentário-opinião nacional – o pressuposto era, no mínimo, chocante. Investigações posteriores mostraram que o crítico português simplesmente não escreveu esse artigo, nem nenhum outro semelhante.
Margarida Rebelo Pinto foi acusada de plagiar-se a si própria por João Pedro George, num livro a ela especialmente dedicado. (Será que eles se conhecem? Serão razões pessoais?) Pelo menos neste caso, o autor não se protegeu com o anonimato; mas trata-se mais de um divertimento pessoal (às custas de outrem) do que de uma acusação com cabeça, tronco e membros. Por definição, ninguém se pode plagiar a si próprio. Se um autor repete as mesmas frases de livro para livro, pode dizer-se que tem falta de imaginação, ou que não tem criatividade, ou que perdeu o gás… Mas o auto-plágio não existe, evidentemente.
Já o caso de Clara Pinto Correia é diferente. Comentador anónimo descobriu que ela tinha copiado, ipsis-verbis, passagens de um texto da revista “New Yorker” sobre Vaclav Havel. Confrontada com a inegável realidade, a ensaista deu uma explicação implausível: tinha copiado essas passagens e, inadvertidamente, esquecera-se de cortá-las no texto entregue à “Visão”. Ora, quem mexe nestas coisas, sabe que; (1) nunca se transcreve um texto, pelo trabalho que dá fazê-lo; se se quer guardar, copia-se (copy-paste) o original; (1) mesmo que se transcreva à mão, por alguma razão incompreensível (que não usá-lo depois) nunca se traduz; transcreve-se na língua original; e (3) é impossível um texto guardado como referência misturar-se com um texto nosso, a não ser propositadamente. A “Visão” apressou-se a informar a “New Yorker” e a pedir desculpa, oferecendo-se para compensar devidademente, etc. Este gesto teve pelo menos o mérito de informar a “New Yorker” da existência da “Visão”… Quanto a nós, o crime de Clara Pinto Correia foi de arrogância; achou, muito simplesmente, que só ela lê a “New Yorker” em Portugal…
Quanto a Miguel Sousa Tavares, surgiu um blog anónimo exclusivamente destinado a acusá-lo de de copiar para o “Equador” partes dum livro de Dominique Lapierre e Larry Collins, “Esta Noite, a Liberdade”. Lendo os textos transcritos pelo blog, é inegável a “inspiração”; mas deve notar-se que se trata de algumas frases num livro de centenas de páginas, que não são essenciais para a história, e que o livro em questão vem citado como referência na bibliografia. Trata-se de um pouco de preguiça no uso da fonte, mas não chega para ser considerado plágio. Contudo, Miguel Sousa Tavares escusava de reagir de uma maneira tão ordinária — isto se se acreditar na reacção publicada no “24 Horas”. (Onde agora Clara Pinto Correia assina uma crónica…)
Verdade ou mentira, não podemos deixar de pensaar na moralidade de se acusar uma pessoa anonimamente. Embora a identidade do acusador não seja essencial, pode perguntar-se o que levará uma pessoa a não querer aparecer, quando a sua “descoberta” lhe pode trazer notoriedade – ou, pelo menos, permitir um debate com o acusado. Ou não está certa do que diz, ou as suas verdadeiras motivações são tão ocultas como o nome. Se a falta de imaginação de Margarida, a arrogância de Clara ou a displicência de Miguel são criticáveis (e muito diferentes em termos de importãncia), muito mais criticável é quem que denuncia sem dar a cara.