E se o 25 de Abril não tivesse acontecido e ainda tivéssemos um partido único, a União Nacional, dirigido autoritariamente por uma quarta geração de ultra-conservadores?
E se as colónias não tivessem sido abandonadas e todos os homens válidos (e alguns ligeiramente inválidos) fizessem mais de três anos de serviço militar obrigatório, dois deles no meio do mato de uma Província Ultramarina?
E se a Igreja continuasse a ser a religião oficial e não existisse o divórcio e os casais não casados não tivessem quaisquer direitos?
E se existisse a censura e não se pudessem ver certos filmes, ler determinados livros e aceder livremente à Internet?
E se estivesse em vigor o Condicionamento Industrial e ninguém pudesse fabricar nada sem autorização superior, para evitar concorrência excessiva?
E se as leis do trabalho fixassem o valor dos salários, impedissem a greve e considerassem como políticos quaisquer protestos trabalhistas?
E se a PIDE/DGS prendesse arbitrariamente quem lhe apetecesse, invadisse a casa das pessoas de madrugada e torturasse os presos políticos, chegando mesmo a bater-lhes no tribunal à frente dos juízes?
E se os opositores políticos pudessem ser condenados a longas penas de prisão em condições abjectas, confinados a residência fixa ou deportados para as colónias, expulsos para o estrangeiro ou privados da nacionalidade?
E se os funcionários públicos tivessem de ser católicos praticantes e tivessem de assinar um juramento de que não pertenciam a partidos subversivos ou organizações secretas?
E se os passaportes fossem condicionados e só válidos para meia dúzia de países?
E se o analfabetismo fosse prevalecente e a assistência social tão deficiente que só os pobres a ela recorressem?
E se o acesso ao ensino superior fosse condicionado económica e politicamente?
E se as profissões tivessem condicionamentos especiais, como as enfermeiras, que não podiam ser casadas?
E se as mulheres precisassem de autorização do marido para se deslocar ao estrangeiro?
E se os filhos de uma mulher tivessem de ser obrigatoriamente registados como filhos do marido e se mantivesse a classificação de filho ilegítimo?
E se os trabalhadores tivessem de pertencer a sindicatos controlados pelo partido único?
E se as eleições fossem raras, a oposição limitada em todos os direitos, as listas manipuladas e os resultados aldrabados?
E se o Presidente da República fosse eleito por um colégio eleitoral constituído por elementos da confiança do Governo?
E se eu não pudesse escrever isto e você não pudesse ler?