Segunda-feira, 7 de Março de 2011

Luta é Alegria

“Os Homens da Luta são uma evidente paródia aos homens da luta. Mas os homens da luta estão radiantes com a vitória dos Homens da Luta”, escreveu

José Teófilo Duarte, com uma certa graça, no seu Blogoperatório, logo no dia seguinte à surpreendente vitória da dupla no Festival da Canção.

 

A vitória é surpreendente apenas porque não se esperava que saísse alguma coisa de minimamente significante de um concurso que há mais de quarenta anos sempre primou pela insignificância – musical e intelectual. Deve-se à votação em massa do público, e essa votação só pode representar uma atitude política, e não estética. Musicalmente, a prestação dos Homens da Luta é tão má como todos os outros concorrentes, senão pior do que a maioria. O que atraiu os telespectadores foi a contestação expressa na letra e na atitude. O pastiche que os Homens da Luta fazem dos tempos do PREC, que eles sempre utilizaram e que irritava tanto a esquerda como a direita, de repente passou a ser uma piada de bom gosto.

 

Jel e Falâncio , atribuindo-lhes inteligência que certamente têm, sempre souberam que andam a fazer troça do radicalismo desses anos revolucionários, usando-a para fazer troça do descalabro em que a revolução caiu. Neste aspecto pode-se dizer que eles são moderníssimos, ao usar uma espécie de meta linguagem. Andam a gozar com toda a gente, da esquerda à direita, porque para eles o humor é provocação e não conhece limites, nem ideológicos nem éticos. Por outro lado, como muito bem diz Carlos Vaz Marques, “estão a falar da nossa situação actual de uma forma de tal modo irónica que dificilmente poderá vir a ser apropriada por qualquer segmento político organizado”. É isso mesmo. Como Patty Smith, eles afirmam “outside is the side I take”.

 

A situação é muito clara: as pessoas andam tão desesperadas e irritadas com o que se está a passar no país que qualquer atitude pública de crítica tem imediatamente grande projecção e provoca ondas de choque – na simpatia do público e na interpretação/apropriação dos intelectuais.

A direita não representada na AR (nacionalistas, fascistas, monárquicos integralistas, ultra-católicos) gosta dos ataques ao regime republicano democrático.  E a esquerda igualmente sem representação parlamentar (que não se identifica com a rigidez ideológica do PCP e do BE) aprecia as críticas à inoperância e incompetência da governação.

 

Já no ano passado os Xutos e Pontapés tinham inadvertidamente disparado essa veia contestatária com a sua “Sem Eira Nem Beira” – e que só não teve seguimento porque eles, cobardemente, se apressaram a desmentir o óbvio, dizendo que o “engenheiro” da letra não era o “ingenheiro” da vida real.

Há um mês foram os Deolinda, e as ondas de choque ainda se estão a expandir – não se sabe até onde. E agora os Homens da Luta vêm alargar as queixas sectoriais dos jovens à rasca à população de todas as idades.

Os políticos de serviço já perceberam o perigo e usam a lógica mais básica: as atitudes contra o status quo são fascistas. Mas o espantalho do fascismo não assusta ninguém, porque é evidente que não existem nem condições nem personalidades para tornar viável uma solução tão estúpida. O que as pessoas querem é uma República Democrática VERDADEIRA, com melhor distribuição de sacrifícios e rendimentos e a punição dos corruptos e dos delinquentes económicos.

Ninguém tem uma solução para o impasse, e portanto toca a cantar a ver se com chacota e ironia se vai lá. É exactamente o que sugere o título da música da dupla: “Luta é alegria”. E o que propõe a letra: “Luta assim não dá, vamos mas é trabalhá”. A ver vamos.

publicado por Perplexo às 01:48
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51 comentários:
De bandarra a 7 de Março de 2011
A senhora, desculpe se a ofendo, deveria pôr pimenta na lingua quando diz asneiras já que pelo lido não lhe o fizeram na devida altura. Imagine só a cena - Óh Pimenta, empresta aí uns milhões de euros! ..ai não emprestas? Vai á merda!
....e o que é que quer o povo?.....
De Maria pimenta a 7 de Março de 2011
Pois é o povo quer dinheiro para um carro novo! E Então?
A minha geração e se calhar a sua, aprendeu a viver para a montra! Não me parece que Esta geração, tenha os mesmos maus hábitos que nós tivemos, até porque não podem. E escusado será explicar, que é mais uma daquelas dos Homens da Luta, para inteligentes!
De bandarra a 10 de Março de 2011
As nossas gerações coabitaram e até confraternizaram, mas não são a mesma. A minha mais antiga memória de montra que me atraia era uma pastelaria com bolos acabadinhos de fazer quando eu ia para o trabalho, litografia rua da rosa, 14 anos, eléctrico antes das sete e meia para bilhete operário. Mas tudo o que podia sentir na boca era saliva que depois ajudaria a digerir o almoço que na pasta de cabedal ia. Minha querida, permita que assim a trate pois me parece, apesar do quid pro quo, ser pessoa de sãs sentimentos, nunca usei roupa ou calçado "de marca". A minha juventude ainda foi passada num tempo em que não havia coca-cola nem macdonalds , em que se agradecia cada refeição que se obtinha, e ainda hoje antes de adormecer pergunto a mim próprio - antónio , ganhaste o que comeste hoje? E tirando alguns domingos a resposta é afirmativa, porque ainda não sou reformado e no pós laboral trato de uns frutos legumes e hortaliças que complementam as minhas necessidades alimentares. E que tristeza sinto ver campos abandonados e frutos por colher.. Porque trabalho não falta, o que falta são empregos. Mas ficávamos um dia a falar. Cumprimentos.

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